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 GASTÓN BAQUERO

 

 

DESENCUENTROS CON JOSÉ KOZER

 

Me dice Nostradamus que yo tengo

en algún sitio del firmamento

una estrella reservada para mí,

                     pero todavía no he ido a él.

 

¡Qué le vamos a hacer! La resignación

con el trágico mandato de los dioses

es la asignatura que supe mejor desde niño.

 

                                                    El desencuentro

mantiene viva la ilusión de lo perfecto.

Amistad desencontrada dura más que la cotidiana,

y se transforma en halo de santidad

                     o en guante de guerrero.

 

Pero yo tengo un desencuentro demasido viejo

con un hombre llamado José Kozer,

que es el pseudónimo preferido

                      de José Kozer.

Un hombre que se me presentó un día

-como se presentó Colón en las Lucayas-

para hablarme de los padres y de otras

                                       profesiones,

y me dejó noqueado con su puño de Poesía,

de auténtica y libérrima poesía de andar por casa,

escasamente poesía de los intersticios del pan

                                                           y del agua.

 

Fue nuestro primer encuentro, y lo conservo

como un talismán contra los desencuentros;

                                                           lo conservo

envuelto en celofán con bolas de naftalina.

Luego vinieron otros encuentros fugaces,

como de quien manda huellas digitales

en vez de personarse, pues nunca

                                             nos vimos

ni con el señor José Kozer ni con su sosías,

ni probablemente nos veremos jamás, porque

con esa ausencia fue creciendo la amistad lejana,

cultivada a pura voluntad de memoria y de olvido;

una amistad hecha de desencuentros

puede ser tan firme como el matrimonio de Eva con Adán,

o como la entraña del corojo.

Ésta es la esperanza:

un búho de mimbre que no cesa de cantar

entre los senos de la Fuente de la India.

 

  [Madrid, 31 de agosto de 1983]

 

 

 

DESENCONTROS COM JOSÉ KOZER

 

Diz-me Nostradamus que eu tenho

em algum lugar do firmamento

uma estrela reservada para mim,

                     porém eu não fui até lá.

 

O que vamos fazer!  A resignação

com o trágico mandato dos deuses

é a assinatura que soube melhor desde menino.

 

                                                   O desencontro

mantém viva a ilusão do perfeito.

Amizade desencontrada dura mais que a cotidiana,

e se transforma em halo de santidade

                     ou em guante de guerreiro.

 

Porém eu tenho um desencontro muito antigo

com um homem chamado José Kozer,

que é o pseudônimo preferido

                      de José Kozer.

Um homem que se apresentou a mim um dia

–  como se apresentou Colón nas Lucayas –

para falar-me dos pais e de outras

                                       profissões,

e me deixou nocauteado com seu punho de Poesia,

de autêntica e libérrima poesia de andar pela casa,

escassamente poesia dos interstícios do pão

                                                         e da água.

 

Foi nosso primeiro encontro, e o conservo

como um talismã contra os desencontros;

                                                           o conservo

envolto em celofane com bolas de naftalina.

Depois vieram outros encontros fugazes,

como  quem manda impressões digitais

em vez de apresentar-se, pois nunca

                                             nos vimos

nem com o senhor José Kozer nem com seus sósias,

nem provavelmente nos veremos jamais, porque

com essa ausência foi crescendo a amizade distante,

cultivada com pura vontade de memória e esquecimento;

uma amizade feita de desencontros

pode ser tão firme como o matrimônio de Eva com Adão,

ou como a entranha do coqueiro

Esta é a esperança:

um mocho de vime que não cessa de cantar

entre os seios da Fonte da Índia.

 

 [Madrid, 31 de agosto de 1983]

 

 

Tradução: Claudio Daniel



 

*

Gastón Baquero, poeta cubano, nasceu em 1914, na província de Holguín. Formou-se engenheiro agrônomo, licenciou-se em Ciencias Naturais, mas abandonou a profissão para dedicar-se à literatura. Foi chefe de redação do jornal Diário de la Marina; colaborou e dirigiu diversas revistas e mantuve estreita relação com o grupo Orígenes, liderado por José Lezama Lima. Após a revolução de 1959, exilou-se na Espanha. Entre seus livros, destacam-se Magias e invenciones (1984) e Poemas invisibles (1991).

*

 

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