ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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 ERIN MOURE

 

 

Does a flower sleep?
Does a branch, touched once by the bird, tremble?
I wish at times I could be touched by
sleep, that I could

forget

I once walked into that rriver
branched out, trembling?

What folly to have tried!
Ay, Ssam Tyago.

[811] #870
Ayra Nunes Clerigo

 

Uma flor dorme?
Um ramo, tocado uma vez pelo pássaro, treme?
Desejo que às vezes eu pudesse ser tocada pelo
sono, que eu pudesse

esquecer

Uma vez entrei naquele rrio
ramificado, tremendo?

Que tolice ter tentado!
Ay, Ssam Tyago.

[811] #870
Ayra Nunes Clerigo

 

Only death or prison could keep me away
I m waiting for you too!
Do you think the day will come?

Or are all these serments sorrows
Are all these oaths just paper

(which doesn t speak.)

The day that day will come?
(it doesn t speak.)

[630_87] #666
Dom Joham d Auoyn

 

Somente a morte ou a prisão me manteriam longe
Estou esperando por você também!
Você acha que o dia virá?

Ou são todas estas promessas pesares
Todas estas juras só papel

(que não fala.)

O dia aquele dia virá?
(não fala.)

[630_87] #666
Dom Joham d Auoyn

 

Please waken. I am suffering from so many
consonants, consoants, and I am
Not a good sufferer.
My modem   and god awakens me
light over Lisbon
.
There should be rhymes. I spent such hours!
A field and sunlight, water dripping from a roof
and marsh grasses.
Please waken. Come and see this light with me, for I
am not a good sufferer.*

[18]
Diego Moriz?

 

Por favor acorde. Estou sofrendo de tantas 
consonantes, consoantes, e não
sou uma boa sofredora.
Meu modem e deus me acordam
luz sobre Lisboa.
Deveria haver rimas. Gasto tantas horas!
Campo e luz do sol, água pingando de um telhado
e relvas de pântano.
Por favor acorde. Venha e veja esta luz comigo, pois eu
não sou uma boa sofredora.*

[18]
Diego Moriz?

 

THE COLD

There was a cold
In which

A line of water across the chest risen
(dream)

Impetuate, or
Impetuates

Orthograph you cherish, a hand her
Of doubt importance

Her imbroglio the winnowing of ever
Does establish

An imbroglio, ever
she does repeatedly declare

to no cold end
Admonish wit, at wit's end, where "wit" is

***

The cold of which
her azul gaze impart a stuttered pool

Memoria address me here (green)

Echolalic fear

Her arm or name in French says "smooth"

A wine-dark seam inside the head, this name
The "my" head I admit, or consonantal glimmer

Insoluble
Or wet fields the vines or eucalyptus wood

Lift from, here

***

Whose cartilage did grief still bear?
Whose silent wound?
Who submitted?
Who fortuitously was grave?
A trepidation honest
Whose declaration met silence?
Whose demurred?
Whose wall shored up became
houses?
Whose "will"?

Whose sympathetic concatenation?  Whose picture
withstood "ordeal"?
Who caressed "that tiger"?
Whose laugh at an airport called forth?  Whose ground
shifted?

* "Por que istos son cantigas
e estamos no verao." (fevereiro)

 

O FRIO

Havia um frio
No qual

Uma linha de água transversal no tórax subia
(sonho)

Impetuata, ou
Impetua*

Ortografia você acaricia, uma mão dela
De importância duvidosa

Seu imbróglio o crivo de sempre
Estabelece

Um imbróglio, sempre
ela repetidamente declara

para nenhum frio fim
Reprove gênio no fim do gênio, onde "gênio" é 

***

O frio do qual
seu olhar azul transmite uma piscina gaga

Memória me endereça aqui (verde) 

Medo ecolálico

O braço dela ou nome em Francês diz "macio"

Uma sutura vermelho-vinho na cabeça, este nome
O "minha" cabeça admito, ou reflexo consonantal

Insolúvel
Ou campos molhados as videiras ou madeira de eucalipto

Levantam, daqui

***

O luto ainda guarda a cartilagem de quem?
Ferimento calado de quem?
Quem submeteu?
Quem fortuitamente era grave?
Uma trepidação honesta
A declaração de quem foi recebida em silêncio?
Contestada de quem?
A parede rebocada de quem tornou-se
casas?

A "vontade" de quem?
Concatenação compreensiva de quem?  O quadro de quem
resistiu à "aprovação"?
Quem acariciou "aquele tigre"?
O riso de quem chamou no aeroporto? O campo desviou
de quem?

 

* Impetuate, impetuates: do verbo impetuar (neologismo).

** Seferis, George; Days of 1945-51, A Poet's Journal, Belknap Press, 1974.

 

A REAL MOTORCYCLE

Unspeakable. The word that fills up the
poem, that the head
tries to excise.
At 6 a.m., the wet lion. Its sewn plush face
on the porch rail in the rain.
Heavy rains later, & maybe a thunderstorm.
12 or 13 degrees.

Inside: an iris, candle, poster of the
many-breasted Artemis in a stone hat
from Anatolia

A little pedal steel guitar 

A photograph of her at a table by the sea,
her shoulder blocked by the red geranium.
The sea tho invisible can be smelled by the casual watcher
Incredible salt air
in my throat when I see her.

"Suddenly you discover that you'll spend your entire life
in disorder; it's all that you have; you must learn to live
with it."

 2

Four tanks, & the human white-shirted body
stopped on June 5 in Place Tian an Men.

Or "a red pullover K-Way." There is not much time left
to say these things. The urgency of that,
desire that dogged the body all winter
& has scarcely left,
now awaits the lilacs, their small white bunches.
Gaily.
As if their posies will light up
the curious old intentional bruise.

 Adjective, adjective, adjective, noun!

 3

 Or just, lilac moon.

 What we must, & cannot, excise from the head.
 Her hand holding, oh, The New Path to the Waterfall?
 Or the time I walked in too quickly, looked up

  at her shirtless, grinning.
  Pulling her down into the front of me, silly!
  Sitting down sudden to make a lap for her...
  Kissing the back of her leg.

  4

  Actually the leg kiss was a dream, later enacted
  we laughed at it,
  why didn't you do it
  she said
  when you thought of it.

  The excisable thought, later
  desired or
  necessary.
  Or shuddered at, in memory.

  Later, it is repeated for the cameras
  with such unease.

  & now, stuck in the head.
  Like running the motorcycle full-tilt into the hay bales.
  What is the motorcycle doing in the poem

  A. said.

  It's an image, E. said back.
  It's a crash in the head, she said.

  It's a real motorcycle.

 

  UMA MOTOCICLETA DE VERDADE

   Indizível. A palavra que reveste o
   poema, que a cabeça
   tenta extrair.
   Às 6 h, o leão molhado. Sua face costurada de pelúcia
   sobre o trilho da varanda na chuva.
   Chuva pesada mais tarde, & talvez um temporal.
   12 ou 13 graus.

   Dentro: uma íris, vela, pôster de
   Artemis de muitos seios em um chapéu de pedra
   de Anatolia

   Uma guitarra de pequeno pedal de aço

   Uma fotografia dela em uma mesa ao lado do mar,
   seu ombro obstruído pelo gerânio vermelho.
   O mar que apesar de invisível pode ser farejado por um observador
   Inacreditável ar salgado
   na minha garganta quando a vejo.

   "Subitamente você descobre que vai passar sua vida inteira
   em desordem; é tudo que você tem; você deve aprender
   com ela."

   2

   Quatro tanques, & o corpo humano de camiseta branca
   parado em 5 de junho na Place Tian an Men.

   Ou "um pulôver vermelho de nylon"* Não resta muito tempo
   para dizer estas coisas. A urgência disto,

   desejo que tem atormentado o corpo o inverno inteiro
   & que mal tem partido,
   agora aguarda os lilases, seus pequenos ramos brancos.
   Alegremente.
   Como se seus ramalhetes fossem acender
    o velho curioso intencional hematoma.
    Adjetivo, adjetivo, adjetivo, substantivo!

    3

    Ou apenas, lua lilás.

    O que devemos, & não podemos, extrair da cabeça.
   
Sua mão segurando, oh, The New Path to the Waterfall?
   
Ou o momento que andei rápido demais, olhei para cima
    para seu torso sem camisa, sorrindo.
    Puxando ela na minha frente, tola!
    Sentando subitamente para eu fazer uma bainha...
    Beijando as costas da sua perna.

    4

    Na verdade o beijo na perna era um sonho, depois encenado
    nós rimos dele,
    por quê não fez isso
    ela disse
    quando pensou

   O pensamento coletável, mais tarde
   desejado ou
   necessário.
   Ou estremecido, em memória.

   Mais tarde, ele é repetido para as câmeras,
   com tal embaraço

   & agora, parado na cabeça.
   Como correndo a motocicleta com tudo nos fardos de feno.
   O que uma motocicleta está fazendo no poema

   A. disse.

   É uma imagem, E. disse de volta.
   É uma colisão na cabeça, ela disse.

   É uma motocicleta real.

 

   AFTERTHOUGHT 1

  0 excise this: her back turned,
  she concentrates on something
  in a kitchen sink,
  & I sit behind her,
  running my fingers on
  the table edge.

  0 excise this.

 

  REFLEXÃO POSTERIOR 1

  0 extraia isto: o dorso dela virado,
  ela se concentra em algo
  em um tanque de cozinha,
  & eu sento atrás dela,
  correndo meus dedos sobre
  a borda da mesa.

   0 extraia isto.

 

   AFTERTHOUGHT 2

   & after, excise, excise.
   If the source of the pain could be located
   using geological survey equipment.
   Into the sedimentary layers, the slippage,
   the surge of the igneous intrusion.
   Or the flat bottom of the former sea
   I grew up on,
   Running the motorcycle into the round
   hay bales.
   Hay grass poking the skin.
   The back wet.

    Hey, I shouted.
    Her back turned to me, its location
    now visible only in the head.

    When I can't stand it,
    I invent anything, even memories.

    She gets up, hair stuck with hay.

    I invented this. Yeow.

 

    REFLEXÃO POSTERIOR 2

    & após, extraia, extraia.
    Se a fonte da dor pudesse ser localizada
    usando material geológico de pesquisa.
    Dentro das camadas sedimentares, o deslizamento,
    a tensão de intrusão ígnea.
    Ou o fundo do apartamento do mar anterior
    Onde cresci,
    Correndo a motocicleta rumo aos redondos
    fardos de feno.
    Grama de feno empurrando a pele.
    O dorso molhado.

    Ei, eu gritei,
    Seu dorso se virou para mim, sua localização
    agora visível apenas na cabeça.

    Quando eu não tolero,
    Eu invento qualquer coisa, até memórias.

     Ela se levanta, cabelo repleto de feno.

     Eu inventei isto. Eiau**.

 

    Traduções: Virna Teixeira

    * K-way: espécie de casaco impermeável de nylon.

    ** Yeow: exclamação inventada (tradução livre).

 

NOTAS:

The cold é um dos vários poemas chamados the cold que fazem parte de um poema longo chamado Calor, e foi publicado em The Frame of a Book, também conhecido como A Frame of the Book (Toronto: House of Anansi, 1999).

A Real Motorcycle foi publicado em Sheepish Beauty, Civilian Love (Montreal: Véhicule, 1989).

(Poemas originais © Erín Moure, do livro O Cadoiro, traduzidos e publicados com permissão de House of Anansi Press Inc. (http://www.anansi.ca) e da autora.)

 

*

Erin Moure é poeta e tradutora (do inglês para o francês, espanhol, galego e português) e vive em Montreal, Quebec. Publicou 12 livros de poesia; seu título mais recente chama-se Little Theatres ou Teatriños. Traduziu poemas da autora galega Chus Pato: Charenton (Shearsman, UK) e m-Talá (Salt, UK).

*

Leia também uma entrevista com Erin Moure e uma tradução feita pela autora de um fragmento do Mar Paraguayo de Wilson Bueno.

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