ZUNÁI - Revista de poesia & debates

 

 

FIAMA HASSE PAIS BRANDÃO



 

GRAFIA 1

Água significa ave  

se  

a sílaba é uma pedra álgida
sobre o equilíbrio dos olhos  

se  

as palavras são densas de sangue
e despem objectos  

se  

o tamanho deste vento é um triângulo na água
o tamanho da ave é um rio demorado  

onde  

as mãos derrubam arestas
a palavra principia

 

GRAFIA 2

Está no rio
o embrião da noite  

O rio livre
com apenas o princípio evidente
de todas as formas

A água íntima dos lábios

 

GRAFIA 3

Tempo
digitado para as direcções do vento  

A orgia dos gráficos nos prolonga
nossos cabelos cronometrados  

Ó virgem com pinheiros nos olhos
morte  

O ovário contínuo onde escuto os objectos
e os transmito nos dedos  

Sem margem delta boca
ó mulher circular permeável ao vento  

Virgem com pinheiros nos olhos
fêmea com nervos e dunas iguais a explosões  

Invoco a madeira o limo o tempo
e entre ventos construo teu abdómen fixo   

 

TEMA 1

Nenhuma ave é central  

Multiplico
teus límpios meteoros
nas esplanadas
e sono
denso ventre com febre túneis
cidade úbere de flancos intermináveis  

Sequer uma ave subterrânea  

em teus olhos rectilíneos
tuas vidraças com pausas para a morte
tuas mãos demolidas
teu vasto sexo desvendado de alicerces

 

TEMA 4

Nenhum sinal nos calcina as órbitas
Voluntários
somos de frente com a imagem
na grafia dos espelhos  

Um teorema de pálpebras nos situa
imunes
à cicatriz dos limites
que bebemos  

Um sismo incontém nossos ombros fechados
Limítrofes
os nossos pés anfíbios
invocam o rio

 

*


Fiama Hasse Pais Brandão nasceu em 1938, em Lisboa. Os poemas acima integram seu primeiro livro, Morfismos, de 1961, que faz parte da publicação conjunta Poesia 61, marco da dicção poética portuguesa.

*

 

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